HELIENE ROSA DA COSTA
Mês da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha do Clã da Negritude, comemorado no dia 25 de julho, reforça a luta histórica das mulheres negras por sobrevivência em uma sociedade estruturalmente racista, misógina e machista – nos faz refletir sobre a vida dessas mulheres.
Neste mês de julho de 2022, escolhemos 25 mulheres negras que estão se destacando no fortalecimento da população negra em diversas áreas do saber, queremos que o mundo conheça suas histórias e que outras mulheres possam se espelhar e inspirar em suas lutas e experiências de vida.
Nossa entrevistada de hoje é Dra. Heliene Rosa;
Eu sonho com o tempo em que as crianças negras consigam se sentir acolhidas e felizes nas escolas, que as mulheres não sofram com violências, explorações e preconceito e que nossos jovens e nossos homens não sejam exterminados por sua cor
01. CN. Para você o que significa o mês da mulher negra latino-americana e caribenha. Qual a importância para às mulheres negras?
R: A celebração dessa data representa uma vitória na luta por visibilidade, por respeito e por reconhecimento para as mulheres negras. Essa luta contra muitas opressões que vem sendo construída historicamente na determinação e na verve de casa mulher negra que se levanta contra o patriarcado.
02. CN. Em sua opinião as campanhas do mês da mulher negra latino-americana e caribenha são adequadas?
R: Entendo que embora haja muito a ser melhorado, estamos fazendo o melhor que podemos, com os recursos que dispomos, diante de um quadro de recrudescimento de forças retrógradas que querem negar os direitos femininos e silenciar nossa voz.
03. CN. Em sua opinião o que é mais urgente para as mulheres negras?
R: Medidas para coibir a violência contra mulheres. Que parem de nos matar. Que seja combatido o preconceito e o ódio contra nós mulheres negras. Que a sociedade pare, de uma vez por todas, de naturalizar o machismo e as mazelas que ele traz para as nossas vidas.
04. CN. Quais os conselhos que você daria para uma jovem negra que quer ser acadêmica?
R: Que lute pelo seu direito de estudar e que se mantenha firme em seus propósitos. E, sobretudo, que se mantenha vigilante para não se deixar seduzir pelos discursos falaciosos da branquitude. Não podemos arredar pé das nossas origens e da defesa das bandeiras do povo preto.
05. CN. Por que a você escolheu a academia?
R: Eu sempre acreditei no meu potencial de crescimento intelectual e da força de transformação que isso agrega a cada mulher. Além disso, sempre fui incentivada por meu pai e minha mãe. Devo isso a ele e a ela.
06. CN. Quais são as dificuldades que você encontrou na escrita do seu livro?
R. Inúmeras: primeiro precisei acreditar em mim mesma e lutar contra as adversidades. Até ingressar na universidade e conseguir concluir a graduação já foi uma grande luta. Depois fazer especialização, mestrado e doutorado trabalhando em dois períodos e cuidando de casa e filhos. Por último, garantir recursos para a materialização do projeto de publicação, parte do dinheiro para a concretização desse sonho veio do financiamento coletivo.
07. CN. Quanto mulher negra o que mais te motiva, justifica?
R: Honrar minhas ancestrais e fazer jus à confiança da minha família em meu potencial.
08. CN. Ao longo de sua história pessoas e profissional o que mais te deixou feliz?
R: Encontrei mestres e mestras inspiradores e inspiradoras que me motivaram e incentivaram a não desistir diante dos desafios e das dificuldades.
09. CN. Qual é a importância de participar de coletivos negros, como o Clã da Negritude e outros que existem?
R: Partilhar experiências, aprender e contribuir com os coletivos nos alimenta, nos fortalece e nos constitui. O Clã da Negritude é Ubuntu!
10. CN. Em sua opinião, o que as mulheres negras estão fazendo algo de errado?
R: Penso que somos vítimas de séculos de exploração, opressão e preconceitos, mas não podemos internalizar esse papel. É preciso levantar a cabeça e seguir lutando.
11. CN. “A solidão da mulher negra” é um tema importante para às mulheres, se sim, por que?
R: Porque tenta nos aniquilar e, muitas vezes, retira de nós o direito ao amor e ao respeito. Isso é injusto e muito doloroso para cada uma de nós e também para as nossas famílias.
12. CN. O que deseja feminismo negro? Quais são suas críticas ao feminismo?
R: O feminismo negro busca compreender e atacar as muitas incoerências que rotulam e relativizam o nosso valor como mulheres. É um movimento que está sempre em construção e, por isso mesmo, enfrenta seus desafios e precisa ser continuamente revisto. Um dos principais desafios é manter coerência e coesão em seus princípios e propósitos. Já que nós, mulheres, somos múltiplas e diversas.
13. CN. Como é ser uma mulher negra em sua cidade/estado?
R: Não tem sido fácil ser uma intelectual negra em uma cidade provinciana e preconceituosa. A luta é constante, em todos os lugares. Na academia, na escola, no supermercado, no hospital, no trânsito, nas relações… sobretudo nas sociais e afetivas.
14. CN. Existe alguma coisa que você gostaria de dizer e que nunca lhe foi perguntado?
R: Sim. Sobre minhas subjetividades, sonhos e desejos. Os assuntos das mulheres negras nunca entram nas pautas. Por isso precisamos tanto da literatura. Ela nos salva.
15. CN. O que é a literatura indígena?
R: É a produção autoral dos intelectuais indígenas na contemporaneidade. São textos que carregam a voz, as memórias, tradições e subjetividades dos povos indígenas. Na expressão genuína dos povos originários.
16. CN. Cite algum texto indígena que mais te marcou?
R: “Metade cara, metade máscara” da Eliane Potiguara; Memórias de um índio do Daniel Munduruku; “Coração na aldeia, pés no mundo” da Auritha Tabajara; “O Tear da Palavra” da Graça Graúna e ” A cor do dinheiro da vovó” do Cristino Wapichana.
17. CN. Quais são os sonhos e planos da Dra. Heliene Rosa para o futuro?
R: Eu sonho com o tempo em que as crianças negras consigam se sentir acolhidas e felizes nas escolas, que as mulheres não sofram com violências, explorações e preconceito e que nossos jovens e nossos homens não sejam exterminados por sua cor.
18. CN. Que conselho você daria para uma jovem negra?
R: Que se mantenha feliz e saudável e nunca aceite a subalternidade como algo natural ou corriqueiro.
19. CN. Nos indique três livros que mudaram a sua vida?
R: “Eu sei porque o pássaro canta na gaiola” de Maya Angelou,
“Metade cara metade máscara” da Eliane Potiguara e “Diário de Birita” da Carolina Maria de Jesus.
Entrevista concedida por Heliene Rosa da Costa ao Clã da Negritude. As perguntas foram feitas e respondidas por texto, formato virtual. 15 julho de 2022.
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