Tatiane Lúcia C. Santana
Mês da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha do Clã da Negritude, comemorado no dia 25 de julho, reforça a luta histórica das mulheres negras por sobrevivência em uma sociedade estruturalmente racista, misógina e machista – nos faz refletir sobre a vida dessas mulheres.
Neste mês de julho de 2022, escolhemos 25 mulheres negras que estão se destacando no fortalecimento da população negra em diversas áreas do saber, queremos que o mundo conheça suas histórias e que outras mulheres possam se espelhar e inspirar em suas lutas e experiências de vida.
Nossa entrevistada de hoje é Dra. Tatiane Lúcia Carlos Santana;
Acredite em si, amor próprio em primeiro lugar! Invista em você, em seus sonhos e projetos, não desista, porquê ninguém disse que seria fácil. Tenha aliados na busca dos seus objetivos.
01. CN. Para você o que significa o mês da mulher negra latino-americana e caribenha. Qual a importância para às mulheres negras?
R: O significado tem expressiva dimensão e importante missão. Isso porque, a sociedade brasileira, carece de representatividade feminina nos mais diversificados setores. Relativamente, no que tange a mulher negra, sabemos que existem grandes enfrentamentos, contra o racismo estrutural, machismo e misoginia. Dessa forma, ter um dia que exalta a mulher negra latino-americana e caribenha é necessário, para que estas, sejam lembradas e principalmente motivadas a estarem aonde almejam estar.
02. CN. Em sua opinião as campanhas do mês da mulher negra latino-americana e caribenha são adequadas?
R: As campanhas que tenho conhecimento, não são abordadas de forma adequada, vez que não vislumbram a realidade da mulher negra, trazem em seu bojo apenas o lado superficial, sem destacar grandes personagens negras como representatividade.
03. CN. Em sua opinião o que é mais urgente para as mulheres negras?
R: Estar em lugares de destaque, principalmente que criem politicas publicas voltadas para a área da educação, de modo a sermos reparadas socialmente pelo histórico vivenciado de racismo, machismo e misoginia, que se perpetua até os dias atuais.
04. CN. Como é ser uma mulher negra em sua cidade/estado?
R: Como costumo aludir, resido em Santa Catarina, estado totalmente “Europeuzado”, cuja a cultura afro fora totalmente apagada. Especificamente, na Grande Florianópolis, poucas são as representatividades negras, não se ve negras em cargos públicos, na politica, ou em lugares de destaque, a imagem que se têm é da mulher negra no carnaval como ” Passista “, de forma sexualizada.
Lembro-me de uma frase que minha tia Shenia me disse ” O homem negro que não se relaciona com uma mulher negra, em algum momento de sua formação pessoal, não se auto-afirmou como negro “, esta frase serviu perfeitamente para que eu entendesse que precisamos nos reconhecer como tal, e a partir disso mudarmos as estruturas impostas pela sociedade.
05. CN. Ao longo de sua história pessoas e profissional o que mais te deixou feliz?
R: Poderia apontar vários, no entanto destaco quando aos 18 anos ingressei na Faculdade de Direito, eu era a única mulher negra da sala, lembro-me bem dos 5 anos de lutas diárias, para que pudesse manter e concretizar meu sonho, me graduei aos 23 anos e logo engravidei de gemelares e tive que suspender meus projetos; E agora recentemente quando fui aprovada no exame de ordem, pois estava há 7 anos tentando, então foi muito especial na minha jornada.
06. CN. Como é ser mãe para você?
R: Ser mãe para mim é um grande desafio, sou mãe de gemeos, vejo neles o nosso futuro, então por eles luto e tento implementar na base cultural e diria filosófica, um pouco de discernimento sobre a vida e como eles podem vencer os obstáculos que está lançará no decorrer do trajeto. Ser mãe foi o melhor acontecimento que poderia acontecer na minha vida, pois eles são meus maiores fãs, e ao mesmo tempo minha maior inspiração.
07. CN. Em sua opinião, o que as mulheres negras estão fazendo de errado ou o que poderia ser melhorado?
R: A mulher negra tem uma visão de conformismo, vejo que muitas familiares e colegas, criam um mundo só delas, em que se auto-defendem, sem às vezes compreenderem que precisamos expor fatos, ter coragem de falar para que as demais tenham voz de fala também, principalmente por vivermos em uma sociedade hipócrita. Ouvi recentemente uma frase, em uma live com a Dra. Ivone Caetano, que fora a 1º mulher negra a ser Juíza e Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que dizia o seguinte ” Uma mulher negra não pode pisar em outra “, logo compreendi que precisamos nos unir para tenhamos espaço e consequentemente mudarmos a forma de como olhamos para nós.
08. CN. “A solidão da mulher negra” é um tema importante para às mulheres, se sim, por que?
R: È um tema de extremante essencial para nós, mulheres negras!. O que me chama a atenção em breve sintese, é forma de como somos vistas perante a sociedade, ouço frases como ” Não sou racista ” logo penso e questiono ” E se seu filho casar com uma negra?!”, nesta reflexão me perco na conotação, haja vista entender que a sociedade impõe parâmetros, quanto ao ser uma mulher ideal, vejo e sinto na pele, que não sou padrão, eis que a visão é branqueada, principalmente em se tratando na visão de homens negros. Lembro-me de uma frase que minha tia Shenia me disse ” O homem negro que não se relaciona com uma mulher negra, em algum momento de sua formação pessoal, não se auto-afirmou como negro “, esta frase serviu perfeitamente para que eu entendesse que precisamos nos reconhecer como tal, e a partir disso mudarmos as estruturas impostas pela sociedade.
09. CN. Em sua opinião qual é a importância da ANAN para a advocacia negra brasileira?
R: Extremamente importante para o exercicio de nosso diploma, visto que somos minoria, e não preenchemos espaços nas seccionais e subceções da OAB, tão pouco somos notados, portanto, ter uma instituição que visa o advogado (a) negra é algo indispensável para comunidade negra em geral.
10. Quais foram ou são suas principais dificuldades no estudo para concurso e como você tem conseguido se superar?
R: Dinheiro para investir em cursos direcionados. Todavia atualmente consegui uma bolsa através da ANAN para estudar no IDAJO, curso preparatório para carreiras jurídicas, os professores são maravilhosos e as alunas maioria mulheres negras que são excepcionais, compartilham histórias e saberes, contribuindo de forma ardúa.
11. Que conselho você deixa para aqueles(as) que desejam passar na prova da OAB?
R: Persistência!. A aprovação no exame de ordem é uma constância, é preciso ter paciência e estar aberto para compreender essa etapa. Assim, tente quantas vezes forem necessárias até conseguir, e no meu caso em especifico, investir em mentoria, na qual me fez estudar de maneira acertada e precisa, controlando assim meus medos e frustrações, e sendo o mais importante, não se compare, cada um tem seu tempo e seu processo, essa prova não define você!
12. Cite 03 mulheres que tem inspiram e porque?
R: Primeiramente minha avó Judite (in memorian), ela era de uma sabedoria ancestral, matriarca da família, nos direcionava ao caminho certo, sempre determinada e guerreira, dizia que eu seria advogada, e assim foi!
Minha madrinha Gilvana, mulher de fibra, objetivada e certeira, de uma sabedoria apreciável, guiada pelos orixas, sempre segurou minha mão e nunca me deixou desistir dos meus sonhos.
Dra Ivone Caetano, desde que ingressei ao Curso de Direito, eu lia noticias sobre a trajetória dela dentro do judiciário, e a duas semanas participei de uma live de um grupo muito especial criado pela Dra. Dione Silva, cuja movimenta mais de 200 juristas negras. A Dra. Ivone, narrou como foi sua jornada pessoal e profissional, para que se tornasse Juíza. Lembro-me que estava desmotivada quanto aos estudos para a Magistratura e ali ouvindo a história dela, me motivou de forma tão potente que me emocionei muito ao ve-la retratar o que a sua época era impossível, mas que não deixou de acontecer, ela foi avassaladora em suas indagações, nunca esquecerei.
13. CN. Quais são os sonhos e planos da Tatiana Lúcia Carlos de Santana para o futuro?
R: São tantos sonhos e planos, porém em especial, passar para o concurso da Magistratura do Estado de SC, isso que me move, meus olhos brilham e meu coração aquece, sei que a trajetória é difícil, mas não impossível, pois creio que tudo acontece quando focamos naquilo que queremos.
14. CN. Que conselho você daria para uma jovem negra?
R: Acredite em si, amor próprio em primeiro lugar!. Invista em você, em seus sonhos e projetos, não desista, porquê ninguém disse que seria fácil. Tenha aliados na busca dos seus objetivos.
15. CN. Nos indique três livros que mudaram a sua vida?
R: O poder do hábito – Charles Duhigg;
Não nascemos prontos – Mario Sérgio Cortella;
Olhos D’ água – Conceição Evaristo.
Entrevista concedida por Tatiane Lúcio C. Santana ao Clã da Negritude. As perguntas foram feitas e respondidas por texto, formato virtual. 19 Julho de 2022.
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Maravilhosa a iniciativa! Parabéns aos envolvidos! Sucesso!